No caminho espiritual, nos contam uma mentira perigosa: a de que o objetivo é eliminar a escuridão para viver apenas na luz. E assim, quando sentimos raiva, inveja ou medo, nós os julgamos como falhas.
Essa busca pela luz é uma espiritualidade pela metade. A verdadeira inteireza não nasce ao se amputar partes de nós, mas ao ter a coragem de servir um chá para nossos demônios e escutar suas histórias. No Tantra, entendemos que tudo é energia. E estas emoções não são “negativas”. São guardiãs. Mensageiras que protegem tesouros da nossa alma. Vamos conhecê-las.
A Raiva: A Guardiã dos Seus Limites

- O Tesouro que Ela Protege: Sua dignidade. Seu espaço. Seu “não” sagrado. Ela é a sentinela em suas muralhas, a força vital que se ergue para dizer: “Até aqui, e não mais.”
- Na Sombra: Reprimida, ela implode em depressão. Projetada, vira julgamento.
- O Diálogo Corporal: Quando a raiva surgir, pare. Sinta-a. É um calor no peito? Uma eletricidade nas mãos? Respire para dentro do fogo. Não para apagá-lo, mas para transformá-lo de um incêndio que destrói em uma lareira que aquece e ilumina seus “nãos” com paz e firmeza. Muitas vezes, a reatividade que explode no corpo em caos de uma discussão é apenas esta guardiã gritando para ser ouvida.
O Medo: O Guardião da Sua Vida
- O Tesouro que Ele Protege: Sua segurança. Sua preciosa vida. Ele é o batedor ancestral em sua tribo interna, que escaneia o horizonte em busca de perigo.
- Na Sombra: Generalizado, torna-se ansiedade crônica, paralisando a vida.
- O Diálogo Corporal: O medo é um fantasma que vive no futuro. Aterre-o no presente. Sinta a solidez do planeta sob seus pés. Nenhum fantasma sobrevive ao toque da realidade. Sinta o peso do seu corpo. Respire na barriga. O medo te puxa para fora; o corpo te chama de volta para casa.
A Inveja: A Guardiã dos Seus Desejos
- O Tesouro que Ela Protege: Seus desejos mais profundos, seus potenciais não vividos. A inveja é uma bússola incompreendida. Ela só aparece quando vemos no outro algo que nossa alma anseia, mas que ainda não nos permitimos buscar.
- Na Sombra: Torna-se amargura, ressentimento, fofoca.
- O Diálogo Corporal: Quando a inveja sussurrar, não olhe para o outro com ressentimento. Olhe para si mesmo com curiosidade. Pergunte: “O que, nesta pessoa, desperta um anseio em mim? Qual a qualidade que minha alma reconhece e deseja?”. A inveja deixa de ser veneno e se torna o mapa do seu tesouro.
A jornada não é para se tornar um santo de gesso. É para se tornar um ser humano soberano, capaz de acolher todas as suas energias sem ser dominado por elas.
A verdadeira luz não é a ausência de escuridão. É a consciência que aprendeu a dançar com suas próprias sombras e a encontrar a sabedoria em cada uma delas. Este é um trabalho que exige uma profunda ética e responsabilidade, e que muitas vezes só se torna possível quando, em um platô de prática, todo o ruído externo se vai e somos forçados a encontrar o que realmente pulsa aqui dentro.